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07/05/2008 - 12h26

The New York Times: Acalmando os demônios e dando uma voz à arte

Abigail Zuger
Marya Hornbacher é uma escritora virtuosa: bem-humorada, articulada e autodidata. E também é, conforme ela mesma documentou em dois livros, dona de uma incurável doença mental.

Mesmo com o melhor tratamento possível, Hornbacher caminha pela mesma corda bamba de Plath, Lowell, Woolf e o restante dos artistas desequilibrados. Fora do medicamento, ela cai num redemoinho de confusa autodestruição que, como ela seria a primeira a reconhecer, gera desilusões e preocupação para seus amigos e familiares, desafios para seus médicos e, na contradição da velha idade, novo alimento para sua musa.

Para cientistas que tentam decifrar o mistério do cérebro e da mente, ela é mais um caso da possível ligação entre doença mental e criatividade artística. Com todos os mapeamentos e neurotransmissores, não estamos muito mais perto de desvendar essa relação do que Lord Byron, que anunciou que os poetas eram "todos loucos" e deixou por isso mesmo. Mas drogas eficazes tornam a pergunta mais urgente: medicada, teria Virginia Woolf sobrevivido para escrever sua obra-prima final, ou passaria seus anos a mais fazendo compras alegremente?

The New York Times
Enquanto a doença mental pode formar parte do ciclo de criação, sem tratamento seus próprios ciclos se sobrepõem
Hornbacher traz à discussão mais do que o emparelhamento usual de cérebro perturbado com mente talentosa. Seu talento criou uma terceira personalidade, um atraente, terrível narrador que pode olhar para trás sobre três décadas de doença maníaco-depressiva, não tratada em sua maior parte, e rodar uma história que é quase impossível de anotar. Da mesma maneira que a psiquiatra Kay Redfield Jamison realizou experiências, gravou e então analisou seu próprio caso no clássico de 1995 "Uma Mente Inquieta" (An Unquiet Mind), Hornbacher oferece a mais perfeita tríade de perspectivas.

Leitores de seu bem recebido livro "Wasted", publicado em 1998 quando Hornbacher tinha 24 anos, a deixaram em um estado de frágil recuperação após longa luta com a anorexia. As primeiras páginas de "Madness" descrevem o quão ilusória era aquela recuperação.

Tomando antidepressivos, o tratamento mais comum para anorexia, ela deu um mergulho em câmara lenta na ansiedade, agitação e desespero de doenças bipolares agravadas exatamente pela medicação errada. Seu mergulho não foi reconhecido pelos profissionais de saúde mental que a acompanhavam o tratamento, incluindo um que sugeriu um regime de velas, banhos e aromaterapia.

Água quente não ajudou em nada; álcool também não, litros dele. Hornbacher finalmente escolheu aleatoriamente um psiquiatra na lista telefônica de Minneapolis e calhou de ser um bom. Sua doença foi precisamente diagnosticada e ela foi devidamente medicada em pouco tempo.

Na televisão, esse encontro daria a deixa para os créditos, mas o livro havia apenas começado. O que segue é uma saga de severas doenças maníaco-depressivas refratárias, com tratamento geralmente questionado pela própria Hornbacher. "Por anos, depois que fui diagnosticada, eu não levava isso a sério. Eu apenas não estava a fim de pensar nisso. Eu deixei tudo rolar de forma desenfreada, e estes são os resultados" - uma década irregular de saúde e trabalho produtivo alternando com recaídas, hospitalizações, tratamentos com choques elétricos e lentas escaladas de volta à frágil saúde.

A auto-absorção de doença mental pode ser desconcertante, ou simplesmente tola. O livro de Hornbacher não representa nenhum dos casos, o que é prova do seu talento. Ela escreve em um elástico "staccato", muito apropriado à sua gaguejante realidade, com um incômodo ouvido para diálogos e um senso comum como linha de partida que contrasta com a total falta de senso de seus piores episódios maníacos.

Quanto à questão central de se o tratamento da doença prejudicaria a criatividade, Hornbacher pesa firmemente para o lado de seus remédios, por mais imperfeitos que eles possam ser. "Para mim, o primeiro sinal da aproximação da loucura é que estou incapaz de escrever." A depressão a silencia; a loucura pode encher sua mente com palavras luminosas, que se dispersam antes que ela possa escrevê-las. Apenas os prosaicos remédios matinais (21 pílulas, na última contagem) a deixarão prender as palavras no papel.

Mais reflexos do mesmo assunto podem ser achados em "Poetas sob Prozac" (Poets on Prozac), uma coleção de ensaios de poetas com doenças psiquiátricas. A maioria dos 16 participantes são décadas mais velhos que Hornbacher, mas enquanto possam carecer de seu vívido estilo de prosa, eles com certeza fornecem uma perspectiva de longo-prazo.

Com problemas abrangendo desde uma leve depressão não medicada até esquizofrenia tratada com uma nada ortodoxa técnica de super vitaminas, esses escritores também buscam "prender" as palavras - e todos concordam que o cérebro doente freqüentemente soletra catástrofe para a mente criativa. Enquanto a doença mental pode formar parte do ciclo de criação, sem tratamento seus próprios ciclos invariavelmente se sobrepõem. "A depressão rouba a voz," escreve Liza Porter. "Silêncio cria depressão. Depressão cria silêncio".

Enquanto isso, o verdadeiro trabalho de editar uma massa de pensamentos e torná-la produto final é puramente linear. Requer desapego e perspectiva, o que Andrew Hudgins chama de "zen químico" de Paxil. "Eu não faço idéia se a droga mudou meu trabalho em qualquer nível fundamental," escreve Hudgins, um professor na Universidade Estadual de Ohio, "mas eu duvido que tenha mudado, o que é um ótimo conforto."

Até mesmo o confiável elixir líquido de inspiração dos poetas é desconsiderado aqui. Que Dylan Thomas seja amaldiçoado; é a primeira poeta nacional de Gales, Gwyneth Lewis, que escreve: "Eu costumava anotar meus estados de mente alterados sob a influência de bebidas, na esperança de que as notas fossem oferecer novas e impressionantes imagens para poemas. Isso não aconteceu. Era impossível decifrar minha caligrafia, e eu não parava de vomitar". Outro mito poético foi enterrado.

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