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16/04/2009 - 20h41

Boto ajuda a indicar concentração de mercúrio na costa marítima fluminense

Da Redação*
Longe de ser apenas um personagem que enriquece o imaginário popular brasileiro, o boto é um indicador natural do nível de mercúrio presente no ambiente aquático, por acumular esse metal tóxico nos seus tecidos.

Essa é a tônica do projeto "O boto-cinza (Sotalia guianensis) como sentinela da saúde dos ambientes costeiros: estudo das concentrações de mercúrio no estuário amazônico e costa norte do Rio de Janeiro", desenvolvido na Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz), como dissertação de mestrado do biólogo Jailson Fulgencio de Moura, com auxílio de uma bolsa da Faperj.

Leif Parsons/The New York Times
O boto-cinza é um indicador natural do nível de mercúrio presente no ambiente aquático, por acumular esse metal tóxico nos seus tecidos
O pesquisador escolheu como objeto de estudo a espécie boto-cinza encontrada desde Santa Catarina até a América Central e membro da família dos Delfinídeos - a mesma dos golfinhos. "O boto-cinza acumula em seu organismo mais substâncias contaminantes presentes nas águas do que outras espécies que habitam o mesmo ecossistema, como os mexilhões. Isso ocorre pelo fato dele ser um animal que vive bastante, até 30 anos, o que aumenta o tempo de exposição às substâncias tóxicas", diz Jailson.

Além disso, o boto-cinza está no topo da cadeia alimentar e ingere animais que já têm no organismo um acúmulo prévio de mercúrio e de pesticidas organoclorados. "O boto-cinza se alimenta de lulas, camarão e peixes, especialmente do peixe-espada, o Trichiurus lepturus, um predador que acumula mercúrio proveniente de outras espécies que consome. Por mais que na água os níveis de mercúrio sejam reduzidos, o metal se concentra mais nos animais do topo da cadeia trófica", explica o biólogo, que teve como orientador na Fiocruz o professor Salvatore Siciliano.

Altamente tóxico, o mercúrio também representa um risco à saúde humana. Em mulheres grávidas, o metal atravessa a placenta e pode até causar danos hepáticos e neurológicos ao feto. Jailson alerta para o perigo de se consumir peixes que estão no topo da cadeia alimentar e, consequentemente, acumulam mais mercúrio: "Nos Estados Unidos, existe uma campanha que estimula mulheres grávidas e em idade provável de gravidez a evitar o consumo de peixes como o tubarão e o atum".

Outra vantagem de utilizar o boto-cinza como alvo da pesquisa é o fato do animal viver sempre na mesma região costeira, facilitando o diagnóstico da saúde do ecossistema. "O boto-cinza habita estritamente em regiões costeiras e não vive em águas profundas, apenas em áreas de até 50 metros de profundidade. Ele não realiza grandes migrações durante sua vida, de modo que sua saúde está associada às condições do ambiente em que vive. Essas peculiaridades da espécie permitem conhecer melhor os efeitos da ação poluidora do homem no ecossistema costeiro", diz.

Comparação com a Amazônia

Com o objetivo de avaliar o grau de poluição dos ecossistemas marinhos, o biólogo observou 20 amostras de músculos de botos-cinzas que habitavam a costa marítima fluminense - de Saquarema até Barra de Itabapoana - e 27 amostras de animais provenientes do litoral do Amapá, que viviam no estuário do Rio Amazonas.

Após três meses de análise das amostras, realizada no laboratório da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Jailson teve uma surpresa. O nível de mercúrio encontrado nos tecidos musculares dos botos-cinzas da Amazônia foi bem menor do que o encontrado nos animais da costa fluminense.

Nos mamíferos coletados no Amapá, o teor de mercúrio variou de 0,07 a 0,79 micrograma por grama (µg/g) de músculo, em peso úmido, com média de 0,38 µg/g. Já nos animais do Rio de Janeiro, a variação foi de 0,2 a 1,66 µg/g, com média de 1,07 µg/g.

"Acreditávamos que a atividade de garimpo na Amazônia tornaria o nível de mercúrio mais elevado na zona costeira marinha. No entanto, foi um dos menores níveis reportados para os mamíferos marinhos, o que indica que o metal está associado aos sedimentos marinhos, e não ao garimpo", destaca o biólogo.

Ele acrescenta que a poluição do trecho da costa fluminense estudado ocorre principalmente devido à influência do Rio Paraíba do Sul, que lança no mar dejetos industriais e agrícolas.

Outra atividade que ameaça o ecossistema da região é o turismo. Morador da cidade litorânea de Cabo Frio, Jailson lembra que o município costuma receber até cinco vezes mais habitantes do que o normal durante o verão.

Apesar dos níveis de contaminação por mercúrio verificados no litoral de Saquarema até Barra de Itabapoana serem superiores àqueles observados na costa do Amapá, os valores encontrados na costa fluminense ainda não estão entre os piores do mundo. Níveis alarmantes já foram apresentados em alguns países da Ásia e da Europa. "Na região do Mediterrâneo e do Mar do Norte, já foram encontrados índices graves, superiores a 60 µg/g", conclui Jailson.

*Com informações da Agência Faperj

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