Filmes sobre temas ligados a saúde não ajudam apenas os médicos a explicarem diagnósticos aos pacientes. Eles também ajudam os professores de medicina a explicar conceitos que não aparecem no microscópio aos alunos de faculdade.
Esse foi o objetivo do médico Ricardo Tapajós, supervisor da divisão de moléstias infecciosas do Hospital das Clínicas da USP (Universidade de São Paulo), ao escrever uma tese sobre o longa-metragem
"E a Vida Continua".
O semidocumentário, de 1993, narra a trajetória de Don Francis, um médico que vivencia as primeiras descobertas sobre a Aids. Mostra o descaso das autoridades na fase inicial da epidemia, os primeiros casos confirmados da doença e a polêmica disputa do pesquisador americano Robert Gallo pela autoria da descoberta (o francês Luc Montagnier também havia isolado o retrovírus).
A análise de Tapajós não apenas gerou debates em salas de aula, como resultou na criação de uma disciplina na faculdade de medicina da USP, chamada "Cinema e Aids".
Tapajós explica que "...E a Vida Continua" aborda temas essenciais da medicina, como morte e sofrimento, segredo médico e eutanásia, só para citar alguns exemplos.
"Além da excelência técnica, o bom médico deve ter traços humanísticos, entender que o paciente tem valores diferentes dos seus", afirma. Se administrar a dose certa de penicilina é algo que se pode aprender nos livros, isso não vale para a maneira correta de contar uma notícia ruim para o paciente. E é aí que entra o papel das artes no ensino médico.
Para o infectologista, o próprio fato de muitos médicos indicarem filmes mostra como o exercício da profissão não está limitado ao conhecimento científico. "Recomendar um filme para reforçar o processo terapêutico transcende a prática médica - é algo que envolve a intuição."